Contribuição do Fotoclube ABCclick e Rose Battistella para o artigo “Não tiramos fotos, fazemos fotos” (Ansel Adams).
Minhas lembranças mais remotas com a fotografia vêm da infância quando uma fotografia era algo bidimensional, tátil e não uma hóspede de uma nuvem ou num HD externo.
Na casa onde cresci nos dias de tempestades quando os raios imperavam nervosos nos céus, a energia acabava e um mundo mágico se revelava. À luz de velas o tempo passava com sombras feitas nas paredes com as mãos. Minha mãe pegava caixas marrons que ficavam guardadas com carinho nas gavetas do quarto. “As caixas de fotografias”.
Lembro dos santinhos coloridos, das cartas com letras desenhadas em papel de seda
delicado, das flores murchas que ainda exalavam perfume, das lembrancinhas de recém-nascidos e de fotos, muitas fotos. Pessoas estranhas, mas que em instantes viravam personagens e protagonistas de suas histórias de vida. Quem eram, onde viviam, o que faziam e o contexto que havia por trás daquelas fotos eram revelados entre risos e lágrimas.
Esses simples pedaços de papéis com imagens desbotadas me levavam para
outros lugares, eu voava e minha imaginação se expandia. A crítica de arte e escritora Susan Sontag diz que: “Ao nos ensinar um novo código visual, as fotos modificam e ampliam nossas ideias sobre o que vale a pena olhar e sobre o que temos o direito de observar… o resultado mais extraordinário da atividade fotográfica é nos dar a sensação de que podemos reter o mundo inteiro em nossa cabeça, como uma
antologia de imagens.
Colecionar fotos é colecionar o mundo.” E assim cresci uma caçadora e colecionadora de imagens. Cercada sempre por histórias. Os caminhos me levaram para as Artes Plásticas e mesmo não sendo de uma família de artistas a arte sempre morou em mim.
Nasci para a arte. Aos dezesseis anos já estava na primeira faculdade de Artes (cursei mais três) e tomada pela inquietude e curiosidade entrei para o mundo do teatro no grupo da universidade.
Atuei em muitos espetáculos, dirigi outros, fui professora de artes e teatro. E a fotografia? Sempre me acompanhando como a margem de um rio. A terceira margem do rio como diria Guimarães Rosa. No laboratório de fotografia analógica nas artes
visuais, nos espetáculos quando íamos aos estúdios para as fotos de divulgação, trabalhando com produção e direção acompanhando todas as etapas, selecionando material para cada novo projeto.
Sempre fui muito fotografada afinal sou uma atriz. Muitas sessões de fotos em diferentes palcos da vida. Sendo palhaça (verdadeiramente) dezenas de vezes assumi o papel de modelo na frente das lentes. Algo que exige concentração e atenção para auxiliar o fotógrafo a produzir as imagens pensadas. Como diz Ansel Adams a câmera é um instrumento de amor e revelação. É ele que nos diz que “não tiramos fotos e sim que fazemos fotos”.
E como modelo sinto-me realizada quando o fotógrafo diz que conseguiu fazer aquilo que esperava, sinal que tivemos sintonia no trabalho. O meu mergulho na fotografia com profundidade e mudança para trás das lentes aconteceu quando realmente entendi que poderia usá-la como mais um meio de expressar o que sentia. Em plena pandemia todas as atividades culturais pararam e a fotografia foi meu meio de expressão.
Afinal faço arte para suportar viver. (a frase não é minha mas me representa muito bem). Então não parei mais de estudar e realizar diferentes ensaios e projetos autorais.
Hoje realizo imagens que possam ultrapassar o objeto. Que façam sentir e refletir. Que não expliquem, mas que possam suscitar a criação de histórias (e aqui vem a ligação com as fotos da infância).
A fotografia é autoconhecimento, auto expressão, conhecendo-me cada dia mais e ao mesmo tempo realidades diferentes, posso dar um sentido a minha realidade e ao que me rodeia.
Ser fotografado é o outro nos vendo pelos seus olhos enquanto fotografar é se procurar. Em ambos os casos estamos conhecendo mais de nós mesmos. Continuo me procurando em todas as formas de arte que possa me expressar. E contando histórias.
Seus projetos podem ser acompanhados em:
@maisamormenospudor
@asmeninasdosolhosderose
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